EXPEDIENTE Nº 7415
Projeto de Lei Nº 448

OBJETO: "Concessão do "Auxílio Reconstrução das Escolas Conveniadas" às escolas credenciadas ou conveniadas com o Município de São Leopoldo afetadas pelas enchentes."

PARECER JURÍDICO

O Vereador Proponente apresentou substitutivo acolhendo "glosas opinativas" deste parecerista.

Apenas em complemento a tudo o quanto já manifestei neste projeto,  acrescento a matéria não está criando atribuições para servidores ou órgãos do executivo,  razão pela qual não incide na limitação constante do art. 61, inc. II letra "b" da Constituição Federal,  e art. 60, inc. II letra "d" da Constituição Estadual.

Também não vejo intromissão na gestão,  isso porque o projeto não versa sobre número de escolas infantis ou sua ampliação, tampouco sobre o número de crianças atendidas. 

Questões relativas a iniciativa parlamentar sobre projetos que geram despesa, adentram em matéria tributária ou estabelecem ou criam políticas públicas, têm recebido interpretação permissiva,  em que pese ainda paire no pensamento de muitos que estaria caracterizado caso de competência restrita.

Veja-se que na  ADI nº 3.178/AP, que é referência para a  interpretação contemporânea do artigo 61, § 1º, o então Ministro Carlos Ayres Britto registrou expressamente o seu posicionamento sobre a criação de políticas públicas pelo Legislativo:

(...) a princípio, não vejo como inconstitucional uma lei, de iniciativa de qualquer parlamentar, que institua política pública no âmbito de órgão estatal ou de entidade preexistente, desde que essa lei não crie fundo, redundantemente, financeiro para o implemento dessa política pública. ADI nº 3.178/AP, publicada em 04/10/2006.

Refiro ainda o Tema 917 do STF que aponta uma visão mais flexiva do Supremo Tribunal Federal acerca da iniciativa de leis que não dispõem sobre organização administrativa, não versam sobre servidores públicos, tampouco sobre seu regime jurídico.  Vejamos:

REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO nº 878.911 RIO DE JANEIRO RELATOR :MIN. GILMAR MENDES RECTE.(S) :CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO ADV.(A/S) :JOSÉ LUIS GALAMBA MINC BAUMFELD E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) :PREFEITO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO ADV.(A/S) :ANDRÉ TOSTES Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade estadual. Lei 5.616/2013, do Município do Rio de Janeiro. Instalação de câmeras de monitoramento em escolas e cercanias. 3. Inconstitucionalidade formal. Vício de iniciativa. Competência privativa do Poder Executivo municipal. Não ocorrência. Não usurpa a competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos. 4. Repercussão geral reconhecida com reafirmação da jurisprudência desta Corte. 5. Recurso extraordinário provido. Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, por maioria, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, vencido o Ministro Marco Aurélio. Não se manifestaram os Ministros Celso de Mello e Rosa Weber.

 

Ao longo de sua manifestação, o Min. Gilmar Mendes explicou com mais detalhamento as razões do seu convencimento jurídico:

          1. Ao contrário do afirmado pelo requerente, a lei atacada não cria ou estrutura qualquer órgão da Administração Pública local. Não procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá ser proposto pelo Chefe do Executivo. As hipóteses de limitação da iniciativa parlamentar estão previstas, em numerus clausus, no artigo 61 da Constituição do Brasil --- matérias relativas ao funcionamento da Administração Pública, notadamente no que se refere a servidores e órgãos do Poder Executivo. Precedentes. Assim, somente nas hipóteses previstas no art. 61, § 1º, da Constituição, ou seja, nos projetos de lei cujas matérias sejam de iniciativa reservada ao Poder Executivo, é que o Poder Legislativo não poderá criar despesa. Ressalto, ademais, no tocante à reserva de iniciativa referente à organização administrativa, que esta Corte já pacificou jurisprudência no sentido de que a reserva de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, prevista no art. 61, § 1º, II, b, da Constituição, somente se aplica aos Territórios federais (ADI 2.447, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, DJe 4.12.2009). No caso em exame, a lei municipal que prevê a obrigatoriedade de instalação de câmeras de segurança em escolas públicas municipais e cercanias não cria ou altera a estrutura ou a atribuição de órgãos da Administração Pública local nem trata do regime jurídico de servidores públicos, motivo pelo qual não vislumbro nenhum vício de inconstitucionalidade formal na legislação impugnada. Por fim, acrescente-se que a proteção aos direitos da criança e do adolescente qualifica-se como direito fundamental de segunda dimensão que impõe ao Poder Público a satisfação de um dever de prestação positiva destinado a todos os entes políticos que compõem a organização federativa do Estado Brasileiro, nos termos do art. 227 da Constituição. Ante o exposto, manifesto-me pelo reconhecimento da repercussão geral da matéria constitucional debatida nos presentes autos e, no mérito, pela reafirmação da jurisprudência desta Corte no sentido de que não usurpa a competência privativa do Chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos (art. 61, § 1º, II, a, c e e, da Constituição Federal). Dessa forma, na linha da jurisprudência desta Corte, conheço do agravo para dar provimento ao recurso extraordinário e reformar o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a fim de declarar a constitucionalidade da Lei 5.616/2013, do Município do Rio de Janeiro.

 

Também não desconheço o disposto no art. 72 da LOM, in verbis:

“Art. 72. É de competência do Poder Executivo a iniciativa das leis orçamentárias e das que abram créditos, fixem os vencimentos e vantagens dos servidores públicos, concedam subvenção ou auxílio ou, de qualquer modo, autorizem, criem ou aumentem a despesa pública.” (Grifei).

Ocorre que ao parecerista é dado à análise de constitucionalidade, legalidade, juridicidade, regimentalidade e técnica redacional dos projetos.

E no exame de juridicidade,  verifico que o projeto está em consonância com a doutrina e jurisprudência contemporânea da Suprema Corte e Tribunais de Justiça que passaram a adotar o entendimento de que as restrições à iniciativa legislativa (art. 61, inc. II da CF) são em numerus clausus e portanto o dispositivo deve ser interpretado restritivamente. 

Diante de tais constatações,  é necessário uma releitura  do art. 72 da LOM em face do art. 61 da CF,  conforme pacífica jurisprudência do STF, e Tribunais de Justiça Estaduais,  para admitir que a iniciativa parlamentar não pode criar ou aumentar a despesa nos projetos de lei cuja iniciativa é do Chefe do Executivo.  Ou seja,  nos projetos cuja iniciativa é comum, não se aplica o art. 72 da LOM.

Vejamos:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE PELOTAS. LEI MUNICIPAL Nº 6.704/2019. INSTALAÇÃO DE CÂMERAS DE SEGURANÇA NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL. PROJETO DE INICIATIVA DO LEGISLATIVO. VÍCIO FORMAL NÃO CONFIGURADO. POSSIBILIDADE DE CRIAÇÃO DE DESPESAS. PRECEDENTES. - A Lei Municipal nº 6.704/2019, de origem parlamentar, trata da obrigatoriedade de instalação de câmeras de monitoramento de segurança nas escolas públicas municipais. - Caso em que o diploma municipal não cria ou altera a estrutura ou a atribuição de órgãos da Administração Municipal, nem trata do regime jurídico de servidores públicos, de modo que inexiste vício de iniciativa. - Embora a lei municipal crie despesas para a Administração, uma vez que não trata das matérias elencadas no art. 61, §1º, inciso II, alíneas “a”, “c” e “e”, da Constituição Federal, e, por simetria, previstas no art. 60, inciso II, alíneas “a”, “b” e “d”, da Carta Estadual, não se verifica usurpação da competência reservada ao Chefe do Poder Executivo. Tema de Repercussão Geral nº 917 (ARE nº 878.911/RJ). - Ausência de dotação orçamentária prévia que não é capaz de tornar inconstitucional a norma, apenas impedindo sua aplicação no exercício financeiro em que foi promulgada. Precedentes. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. UNÂNIME.(Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70083099556, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em: 30-04-2020).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 3.924, DE 25 DE AGOSTO DE 2021, DO MUNICÍPIO DE LORENA, QUE DISPÕE SOBRE A CONCESSÃO DE AUXÍLIO-GÁS À FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. 1) Norma de iniciativa parlamentar. Inexistência de conflito entre o Poder Legislativo e o Poder Executivo quanto à iniciativa de lei que cuida de diretrizes gerais de política pública, voltada à proteção da população carente, com reflexos, pois, à proteção da dignidade da pessoa humana, prevista constitucionalmente (art. 1º, III, da Constituição Federal). Matéria que não se encontra no rol de iniciativa reservada do Poder Executivo elencado no parágrafo 2º do artigo 24 da Constituição Estadual. 2) Violação ao princípio da Reserva da Administração. Reconhecimento. Imposição de obrigações a setores da Administração e a seus servidores, com a determinação de prática de atos administrativos, sem deixar margem de escolha para o administrador. Afronta aos arts. 5º, 47, II e XIX e 144, todos da Constituição Paulista. 3) Irrelevante a arguição de criação de despesas. Eventual ausência de receitas acarreta, no máximo, a inexequibilidade da norma no mesmo exercício em que foi promulgada. 4) Inaplicabilidade do art. 113 do ADCT ao presente caso, por não se tratar de matéria fiscal (criação ou renúncia de receitas). 5) Ofensa aos artigos 174, III, e 176, I, da Constituição Estadual reconhecida, eis que o diploma legal ora impugnado implica na alteração da lei orçamentária anual, cuja iniciativa legislativa é reservada ao Chefe do Poder Executivo. Precedentes deste C. Órgão Especial. Ação julgada procedente, com efeito ex tunc, ressalvada a irrepetibilidade de valor eventualmente pago.” (TJSP;  Direta de Inconstitucionalidade 2218796-89.2021.8.26.0000; Relator (a): Cristina Zucchi; Órgão Julgador: Órgão Especial; Tribunal de Justiça de São Paulo - N/A; Data do Julgamento: 27/04/2022; Data de Registro: 30/04/2022)

Considerando que o Vereador indica rubrica com suficiência orçamentária para subvenções e auxílios,  entendo que a norma em exame não provoca alteração na lei orçamentária - esta sim de iniciativa do Chefe do Executivo.

A subvenção possui previsão na peça orçamentária,  e o vereador via projeto de lei orçamentária está apenas direcionando e objetivando mais precisamente o destino dessa subvenção.

Assim,  opino pela constitucionalidade formal e material do substitutivo (ID 138787).


Votação: Maioria Absoluta
Comissões:            Constituição e Justiça

   São Leopoldo, 19 de Junho de 2024.

   Jefferson Oliveira Soares.´.

Consultor Jurídico.

   

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