Trata-se de proposta de emenda modificativa ao expediente 2058/2018.
Antes, porém, refiro que tomei conhecimento de "projeto substitutivo" protocolado pelo Vereador Júlio, contudo, no tocante à presente emenda o conteúdo original permanece inalterado, razão pela qual o presente expediente mantém incólume o seu objeto.
O Vereador possui tal legitimidade, conforme inteligência dos artigos 134 da Lei Orgânica e art. 78, inc. VII do Regimento Interno.
A previsibilidade da proposição de emendas ainda consta dos artigos 103 e seguintes do Regimento Interno.
Quanto ao objeto da emenda está em consonância com o objeto do projeto original.
Não havendo vícios formais, a emenda está apta a ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça, tal como preconiza o artigo 108 do RI.
A alteração proposta visa afastar do Prefeito a "ultima palavra" no âmbito do processo administrativo, sendo que em caso de interposição de recurso, este deverá ser conhecido e julgado por uma outra junta administrativa, diversa da que analisou a defesa.
Primeiramente, destaco que o Código Municipal do Meio Ambiente em seu art. 517 admite a edição de lei estabelecendo processo administrativo diverso do constante nos artigos 517 a 533 do referido código. Vejamos:
Art. 517 Este capítulo objetiva estabelecer normas básicas sobre o Processo Administrativo de análise e julgamento das infrações administrativas ambientais, excetuados os casos em que a lei define Processo Administrativo próprio. (Grifei).
Ressaltando-se a hipótese da insegurança jurídica, em razão de diferentes procedimentos para o processo administrativo, verifica-se que o Código Municipal do Meio Ambiente autoriza a edição, por lei, de "processo administrativo próprio".
Refiro, ainda, questão relativa a insegurança jurídica até mesmo pelo fato da vigência do Decreto Municipal 6798/2001, onde ocorreu a regulamentação do processo administrativo em geral em âmbito municipal, e agora, estarmos diante de mais um procedimento.
A hipótese versada na emenda possui procedimento análogo em âmbito municipal, mas por força de lei federal, que em relação às autuações de trânsito submete as defesas à JADA - Junta Administrativa de Defesas e Autuações, e o respectivo recurso quanto interposto é analisado pela JARI - Junta Administrativa de Recursos de Infrações. contudo, nesse caso existem peculiaridades, tais como a composição da JARI que se dá por servidores estáveis e por representantes da sociedade civil em atividade remunerada para tal fim. Aliás, em razão de obrigatoriedade determinada pelo Código Brasileiro de Trânsito.
Para melhor enfrentamento da questão posta, trago à balha o conceito de recurso. Com efeito, é da natureza humana a falibilidade (razão pela qual admite-se o erro nas decisões processuais), bem como é inerente a todo o ser humano a irresignação diante de um resultado desfavorável. O recurso, surge como uma ferramenta para reexame de uma questão posta ao crivo da autoridade, administrativa ou judiciária, com o objetivo de reverter determinada decisão, invalidá-la, modificá-la parcialmente, ou obter esclarecimentos.
Segundo leciona a estimada Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, os "Recursos Administrativos são todos os meios que podem utilizar os administrados para provocar o reexame do ato pela Administração Pública."(Direito Adnministrativo, 29ª edição, Editora Forense, 2016, p.884).
Assim, o direito a interposição de recurso tem uma base na questão psicológica (inconformidade natural do homem com uma decisão desfavorável em juízo único), e outra na falibilidade humana, tendo em vista a possibilidade de erro no julgamento de primeiro instância. Portanto, estamos nos referindo ao princípio do duplo grau de jurisdição, informador de todo e qualquer tipo de processo, garantindo que qualquer decisão venha a ser examinada por autoridade superior. Aliás, direito assegurado no art. 5º, inciso LV da Constituição Federal.
Observo que a emenda respeita o princípio do duplo grau de jurisdição, pois refere que a junta que julgar a defesa, não seja a mesma a enfrentar eventual interposição de recurso.
Outra questão a ser ventilada, diz com o fato do julgador dos recursos ser necessariamente "autoridade superior", em relação à Junta que julgou a defesa. A questão tem relação com o princípio da hierarquia em âmbito recursal.
Diógenes Gasparini, in Direito Administrativo, Editora Saraiva, 2003, p. 527, refere que "recurso hierárquico é o meio adequado para o superior rever o ato, decisão ou comportamento de seu subordinado..."
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ob. cit., também refere que o recurso hierárquico, como é o caso no procedimento em análise, requer apreciação por "autoridade superior à que proferiu o ato". Diz mais, que o recurso hierárquico é próprio, quando a autoridade superior é do mesmo órgão, ou impróprio quando a autoridade superior é de outro órgão.
Não vejo atendido esse pressuposto recursal, especialmente porque servidores de uma mesma hierarquia estarão decidindo a defesa e o recurso.
Finalmente, o princípio da impessoalidade - inerente à administração pública - invocado como fundamento da emenda na sua exposição de motivos, é suscitado de maneira totalmente equivocada.
Os princípios norteadores do processo administrativo conforme pacífica doutrina especializada são os da legalidade, da publicidade, da oficialidade, da obediência a formas e procedimentos, da gratidade, da atipicidade, da ampla defesa e contraditório, da economia processual e da pluralidade de instâncias, além dos princípios que também são inerentes ao direito administrativo, valendo referir a supremacia do interesse público, motivação, razoabilidade e proporcionalidade, moralidade, eficiência e segurança jurídica. Aliás, a Lei Federal 9784/99 de aplicação à esfera federal contempla esses princípios, e o Decreto Municipal 6798/2011 também os contempla.
Já o princípio da impessoalidade, previsto no art. 37, caput, da Constituição Federal, diz respeito essencialmente com o dever de probidade para com a administração pública, não se prestando a limitar que o Administrador exerça os atos necessários à administração da coisa pública.
Quando a constituição refere que a administração pública rege-se pelo princípio da impessoalidade, não é para o efeito de afastar o agente público ou político da condução de determinado ato, como equivocadamente preceituou a justificativa da emenda, mas sim para o fato de que a gestão seja impessoal, imparcial, ou seja, de um modo moral e pautado pela supremacia do interesse público.
Portanto, opino pela ilegalidade e inconstitucionalidade da emenda.
É o parecer.
Votação: Maioria simples.
Comissões: Constituição e Justiça
São Leopoldo, 20 de Junho de 2018.
Jefferson Soares,
Consultor Jurídico.